14/09/2014

COMO EU AQUEÇO - ADRIAN PINZARU


Tudo começou quando li uma matéria da revista inglesa The Strad, onde o violista Maxim Rysanov explica como é sua rotina de aquecimento. Mas cada um tem seu modo de entrar no estudo, de aquecer as turbinas para tocar. Por isso resolvi começar essa série.

A partir de hoje o Papo de Violinista publica o COMO EU AQUEÇO, série de entrevistas com músicos que falam sobre suas rotinas e rituais. Na primeira delas, eu, Helena Piccazio, entrevisto Adrian Pinzaru, primeiro violino do delian::quartett.

Helena Piccazio – Adrian, como você aquece? Qual a primeira coisa que faz quando pega o violino?

Adrian Pinzaru – Considero que o aquecimento tem dois aspectos fundamentais. O primeiro deles é colocar você em estado de atenção. Quando se está sem o violino, a atenção está dispersa, espalhada por todos os lados. Assim, o primeiro aspecto do aquecimento é reunir essa atenção, concentrar-se, tornar-se atento, focado e, portanto, sensibilizar o ouvido. 
Todos os movimentos físicos que vou fazer são destinados não apenas a reaver o movimento dos dedos, a sensibilidade, a elasticidade, etc. - que é obviamente o segundo aspecto fundamental do aquecimento -, são exercícios feitos para que eu possa trazer a minha atenção para a música. E depois, cada um tem seu grupo de exercícios, cada um tem seu próprio ritual, digamos, porque são rituais mesmo, esses de aquecimento.

Helena – E qual o seu ritual? Quais os exercícios que você faz para os músculos, junto aos que faz para a cabeça?

Adrian – Faço arpejos, e... tendencialmente faço arpejos. Depois, faço também exercícios do Schradieck. E exercito a aderência do arco, para reaver também o braço direito, para ter o feeling do instrumento.

Helena – Entendi.

Adrian – Mas repito, para mim a coisa mais importante do aquecimento – a finalidade de todos os exercícios, digamos, esse ritual -, é exatamente focar no instrumento e ter de novo em mãos o meu físico, isto é, reaver a sensibilidade. Isso. E depois faço uns outros exercícios, não tem nada de mágico em tudo isso, tudo serve. Mas essa coisa da atenção, da concentração, é muito importante.

Helena - Como trabalhar a mente quando se está realizando exercícios mecânicos, os exercícios de todo o dia: os arpejos, o Schradieck, etc.

Adrian – Concentrar-se em si mesmo. Um exemplo: se não estamos tocando violino a nossa atenção está direcionada a várias coisas ao redor, nas tantas atividades que fazemos todos os dias, nos distraímos olhando o livro em cima da mesa, as paredes, etc. Quando aqueço, naquele ponto, toda a concentração, toda aquela atenção que está fora, se volta pra mim, ao meu físico e ao instrumento. É uma espécie de “recolher-se”, de recolhimento. Para depois eu ser capaz de tocar, isso, esse é o ponto. Porque com a atenção distribuída não se consegue tocar. Para fazer música você tem que ter contato com o seu físico.

Helena – Quanto tempo dura o seu aquecimento?

Adrian – Ah, é variável, depende obviamente das condições nas quais eu me encontro, porque se, sei lá, no inverno venho da rua, tô morrendo de frio, as mãos rígidas, os músculos um pouco contraídos, aí um pouco mais, senão menos. Mas de qualquer forma o meu aquecimento não dura tendencialmente mais de 5 minutos.

Helena – Você se concentra rápido.

Adrian – É experiência. Mas depois, eu também posso fazer, sei lá, um estudo, ou mesmo um Capricho, ou mesmo escalas, qualquer coisa que tenha uma finalidade em si mesma. O aquecimento serve apenas para reencontrar o meu físico, para depois conseguir fazer tudo aquilo que tenho que fazer. O aquecimento para mim é somente reencontrar a mim mesmo e reencontrar o instrumento, a sensibilidade sobre o instrumento. Depois, se preciso resolver problemas técnicos faço exercícios de técnica, obviamente a técnica eu a odeio, então só uso quando preciso resolver algo.

Helena – Ok.

delian::quartett
Adrian – Pra mim é muito importante o conceito, aquele da concentração. O cérebro é o que faz com que nós possamos tocar um instrumento. Não são os dedos, os dedos não têm memória.

Helena – Obedecem.

Adrian – Exato. Então é muito importante que os estudantes entendam que a concentração é tudo. Não se pode tocar desconcentrado. E assim a concentração ajuda você a resolver 
também problemas com o próprio físico, de tensão, mas se você está desconcentrado, aí sim os problemas aparecem!

Helena – Muito obrigada!

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Adrian Pinzaru, violinista e violista romeno, mora na Itália há mais de 20 anos. É primeiro violino do delian::quartett  e atua como solista e camerista convidado de instituições como o Musik Verein de Viena, Unione Musicale de Torino, Festival MiTo Settembre Musica, Ludwigsburger Schloßfestspiele,  Schlezwig-Holstein Musik Festival, Berlin Philharmonie, Essen Philarmonie. Colabora com artistas como Gilles Apap, Mario Brunello, Gérard Caussé, José Luis Estellés, Igor Kamenz, Alfredo Perl, Menahem Pressler, Dora Schwarzberg e Giovanni Sollima.
Adrian desenvolve intensa atividade didática como assistente de violino de Dora Schwarzberg, na Academia de Música de Pinerolo, Itália, e como docente no Curso de Música de Câmara para Jovens Instrumentistas de Arco em PraCatinat, Itália.
Em julho de 2013, Adrian veio ao Brasil como solista convidado da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre, junto com o violoncelista do delian::quartett, o francês Romain Garioud. Tocaram o Concerto Duplo de Brahms em La menor, opus 102.


delian::quartett, quarteto de Haydn op. 33, IV movimento

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Adrian Pinzaru, foto de Giorgio Vergnano
delian::quartet, foto de Julien Mignot

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