14/05/2016

VOCÊ É INSUBSTITUÍVEL? [parte 1]

por Dr. Noa Kageyama, publicado originalmente no blog do site The Bulletproof Musician
ARE YOU IRREPLACEABLE? [part I]


Assinatura do Heifetz num cartãozinho
Foto encontrada aqui
Eu tinha uma aula na pós-graduação que tratava do lado comercial de perseguir uma carreira musical. Era uma aula ótima, mas forçou muitos de nós a encarar a realidade da indústria da música de uma forma que nunca tínhamos feito antes.

Em um dia particularmente memorável, o professor começou a aula fazendo uma pergunta simples, mas direta, que silenciou a sala. No meu entender o silêncio significava que ninguém tinha uma resposta, ou que ninguém tinha coragem de falar sua resposta na frente de todo mundo.

Qual foi a pergunta?


"Por que eu deveria tirar tempo da minha rotina atarefada e dinheiro do meu bolso para te ouvir tocar?”

Ixi. A boa notícia é que não só esta pergunta vai te ajudar a encontrar seu nicho no mundo competitivo da música, mas respondê-la também vai mudar sua experiência ao tocar. Quando consegue articular uma resposta para esta pergunta, você se vê cada vez mais capaz de direcionar sua mente para os aspectos da música e do seu desempenho que levam a performances otimizadas, e foca cada vez menos em hesitações e nervoso do tipo "O quê que estou fazendo aqui?”

Você é indispensável?

O autor de best-sellers e guru do marketing Seth Godin escreveu recentemente um livro entitulado Linchpin, no qual ele faz ao leitor essa mesma pergunta. A maioria de nós, ele sugere, acaba se tornando "engrenagem" na organização, empresa ou profissão da qual fazemos parte. A gente aparece para trabalhar, faz o suficiente para manter o nosso emprego, vai para casa, e repete.

Infelizmente, isso nos torna substituíveis. Se não há nada de interessante que nos distingue do "engrenagem" ali ao lado, o que impede algum outro engrenagem de tomar nosso lugar? Há novos engrenagens se formando em escolas de todo o país todos os dias, só esperando para tomar nosso lugar. Engrenagens podem se matar de trabalhar, mas não têm nome, nem rosto, nem são dignos de nota, e são altamente esquecíveis.

“Cavilhas de Mola” (significado de "linchpin", o nome do livro, que em inglês também significa uma pessoa ou coisa que mantém juntos vários elementos de uma estrutura complexa), por outro lado, não são tão facilmente substituídos. "Cavilhas" são pessoas que pensam de forma criativa, arriscam falhar, expressam sua individualidade, e acabam criando algo único, transcendente e, finalmente, insubstituível.

Quem são esses caras insubstituíveis?

Cavilhas são pessoas como o projetista do iPod Jonathan Ive; o Diretor Geral da Virgin, Richard Branson; e, claro, Elvis. Cavilhas não são apenas pessoas famosas, mas pessoas presentes em nossas vidas diárias também. Pessoas como o médico de família no fim da rua que ainda faz visitas em casa, a simpática garçonete da lanchonete que lembra teu nome e sempre está com o seu café te esperando, e Deb, a assistente administrativa na minha pós-graduação que sempre saiu do seu caminho para rastrear professores, entregar pessoalmente documentos e dar aquelas telefonadas a mais para garantir que a nossa papelada fosse processada, nosso cheque pelo trabalho de assistente assinado, nossos tickets de estacionamento renovados, etc., para que pudéssemos nos concentrar nos estudos e projetos de pesquisa - em vez de nos distrair e desviar nos obstáculos administrativos - enquanto perseguíamos nossos títulos.

Mas o que isso tem a ver comigo?

Seja qual for a carreira que você persiga, solo, orquestral ou docente, pergunte a si mesmo: o que me faz diferente de todos os outros músicos no mundo lá fora? O que eu trago à mesa que me diferencia da próxima pessoa? O que faz de mim o professor que sou? O que me faz soar como Eu? Qual é a minha "assinatura" ou soundprint (carimbo sonoro), se você preferir? O que faz Bach soar como Bach? Como você sabe que está ouvindo o Yo-Yo Ma? O que faz Louis Armstrong soar como Louis Armstrong?

E a resposta correta não é que você pode tocar mais rápido, mais limpo, ou com um som melhor ou maior. Quem vai num concerto provavelmente não vai pagar R$80 só para te ouvir cometer menos erros do que todos os outros, se podem ouvir algumas das grandes performances da história de graça no YouTube.

Então pelo quê o público paga?

Eu acredito que o público paga por inspiração. Por um vislumbre momentâneo de beleza; um encontro com algo que é de alguma forma transcendente e que os arrebata para fora de sua existência normal e rotineira. Alguém disse uma vez que, no fim das contas, em nossas vidas a única moeda que nos interessa é como nos sentimos.

Tocar mais rápido, mais forte, mais afinado, ou com um som mais bonito não são os ingredientes essenciais de uma performance mágica e de um músico insubstituível.

Então, como me torno insubstituível, você pergunta? Eu vou fazer uma tentativa de resposta para esta questão na Parte II... mas, enquanto isso, a questão mais importante pode ser: qual é a sua resposta?

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Dr. Noa Kageyama é um violinista que resolveu partir para a área da Psicologia da Performance e hoje integra o corpo docente da Juilliard School e New World Symphony em Miami, além de ser convidado das principais instituições de ensino de música nos EUA, ensinando músicos como tocar o seu melhor sob pressão através de aulas ao vivo, treinos e um curso on-line.


Tradução autorizada, por Helena Piccazio.

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